Apetite por novidades, capacidade de liderar, criatividade aflorada. Algumas dessas características nascem com quem as têm e facilitam a vida de quem resolve seguir o caminho do empreendedorismo. É possível dizer, então, que algumas pessoas nasceram para empreender?
Responder à pergunta com um sim poderia indicar que não há como empreender com sucesso se a pessoa não tiver algumas dessas características. Já um simples não descartaria o peso de algumas valências inatas na atividade de abrir e fazer crescer um negócio. Como costuma ser o caso com questões complexas, a resposta mais precisa está no meio do caminho e leva em conta uma série de nuances importantes.
Há algum consenso, no entanto, de que algumas características de personalidade ajudam quem se torna empreendedor. “Há pessoas que nascem com algumas predisposições, que a gente pode chamar de talento. Assim como existe com o artista, o músico, o cientista, acontece com o empreendedor também”, explica o professor William Antonio Cerantola, doutor em Ciências da Comunicação (ECA/USP) e mestre em Administração de Empresas (FEA/USP).
Cerantola cita a classificação tipológica de Myers-Briggs (MBTI, na sigla em inglês), que usa quatro dimensões para classificar diferentes tipos de personalidade, para exemplificar como seria esse perfil mais propenso ao empreendedorismo. Na metodologia, há quatro dicotomias estabelecidas: extrovertidos x introvertidos, sensoriais x intuitivos, racionalistas x sentimentais e julgadores x perceptivos. “O perfil preferencial do empreendedor seria o de extroversão, sensação (prefere fatos, evidências, é mais pragmático), sentimento (é confiante, tem facilidade para interagir com pessoas) e julgamento (é decidido, esquemático, cumpre prazos)”, destaca.
Professor e pesquisador da Fundação Dom Cabral, Hugo Braga ressalta também o que chama de características de “pioneiro” como importantes para o empreendedor: “Tem de ser superinovador, mas também ser enérgico, ter facilidade de adaptação ao contexto. É preciso ser propício ao chamado ‘erro honesto’, ou seja, é uma pessoa que testa e erra constantemente”.
Ambiente e capacitação também contam
Só que reunir essas características desde o berço não é garantia de nada. Assim como não tê-las não descarta as chances de alguém fazer sucesso como empreendedor. Outros fatores que vão além dos inatos pesam também.
Braga destaca como o ambiente em que o empreendedor está inserido pode ser decisivo: “As pessoas nascem empreendedoras? Formadas? Não. Quando a gente fala do Vale do Silício, da startup que nasce na garagem de casa, não dá para comparar com a situação do Brasil. As pessoas que montam seus negócios nos Estados Unidos estão cercadas de um ambiente com forte incentivo ao empreendedorismo. Com investimento pesado em pequenas e médias empresas, tradição das universidades americanas de atuar nesse sentido”, analisa.
A busca por conhecimento, aliás, é algo que pode “virar o jogo” de quem não nasceu com características de personalidade que ajudam o empreendedor. É possível, por exemplo, buscar ferramentas que incentivam a pessoa a se tornar mais criativa.
Cerantola destaca como isso pode servir como algum contrapeso às agruras da crise. Ao mesmo tempo em que deve crescer o número de empreendedores por necessidade, ou seja, que abrem negócios por precisarem de renda, as oportunidades para capacitação se ampliaram. Se não tiverem todas essas características de nascença, esses empreendedores tendem a ter mais oportunidades para desenvolvê-las.
“Teremos muitos insucessos nesses empreendimentos. Em contrapartida, como esse é um momento muito particular, estão surgindo iniciativas de grupos de discussão, webinar, muitos cursos que passaram a ser divulgados. Como todos estão conectados, a gente percebe que teve facilitação desse acesso”, afirma o professor.
VAE, G1
Empreendedorismo