Enfermeira anda de jegue para atender moradores de zona rural na Chapada

Published at : 01 Mar 2022

Ela quis desmistificar "a elitização do profissional de saúde"

Sobre o lombo de um jegue, a enfermeira Monaliza Sena, 31 anos, segura nas mãos os kits de proteção contra o coronavírus e com os pés orienta o animal na zona rural de Boa Vista do Tupim, na Chapada Diamantina. É como a profissional, funcionária de um posto de saúde, decidiu chegar às casas mais distantes da região.

Desde a primeira vez que subiu no animal para agilizar o serviço, recebeu centenas de comentários em suas redes sociais, mensagens e ligações. “

Queria desmistificar a elitização do funcionário de saúde”, conta ela, nativa da cidade.

Monaliza contou ao CORREIO sobre sua rotina, as dificuldades de trabalhar em uma área rural, o que mudou com a pandemia e como o jegue - ainda sem nome e emprestado de outro nativo - se transformou em seu parceiro.

Leia o diário de uma enfermeira que usa jegue como meio de transporte: 

"Quando cheguei ao Assentamento Aliança, área rural daqui de Boa Vista do Tupim, os moradores já esperavam a equipe de saúde. O último dia 5 foi de distribuição – álcool em gel e informação para eles se protegerem contra o coronavírus – e de vacinação contra a gripe. Quem é do interior sabe que a área rural é cheia de cancelas, cercas e arames. De carro, precisamos ficar descendo, abrindo e fechando as coisas. Foi quando tive a ideia de pedir um jegue emprestado de um morador, Jorge, para percorrer o assentamento onde moram 80 famílias. Todos ficaram surpresos, rindo. Ninguém espera que uma profissional de saúde ande de jegue. 

Não era, nem é, nada pretensioso, quero apenas dinamizar o serviço e agilizar as coisas. Meu posto atende a cidade e duas áreas rurais. O jegue já é um meio de transporte por todos daqui. Mas, queria desmistificar a elitização do funcionário de saúde. E é o que tem acontecido. A única surpresa sou eu, enfermeira, estar nessa posição. Muitas vezes existe uma barreira entre nós e pacientes porque falta essa identificação. 

No primeiro dia em que andei de jegue, vi o quanto eles ficaram felizes porque vivenciei sua rotina. Alguns são bem pobres. Sou filha daqui e sempre andei de cavalo e de jegue. Criança, eu saía da casa de minha avó de jegue até a feira da cidade. Todos se emocionam por me ver como um deles e eu digo isso com os olhos marejados.

O coronavírus começa a avançar na vizinhança como em Itaberaba, onde já são mais de 200 casos. Temos quatro casos. Poder me aproximar dessas pessoas, levar informação como uma delas, é o que importa para mim. Nossa vida é pacata, a cultura é forte e é o que eu gosto. É bom poder ajudar quem já me colocou no colo, meus amigos de infância, quem me viu nascer. Andar de jegue deu tão certo que decidi adotar em outras idas. É impressionante como criamos uma conexão.

Voltei ao assentamento uma semana depois e todo mundo brincou. Novamente, peguei o jegue de Jorge e circulei pelas casas. Fiquei feliz em ver como nosso trabalho ali tinha funcionado. Tínhamos conseguido atingir os moradores. A cancela estava fechada com cadeado e eles improvisaram um lavatório na entrada para, quando você entrar, lavar as mãos. Há muitos profissionais de saúde em áreas remotas que sabem bem o que eu estou falando.

Chego ao posto às 8h e vou pelo menos uma vez por mês a essas áreas rurais. O carro do posto demora até uns quarenta minutos para chegar. A internet mudou bastante a vivência deles, mas muitos não têm condições para buscar informação por vários motivos. Venho ao trabalho a pé e posso, como qualquer outro, subir em motos, jegues, cavalos, para chegar a quem precisa. Aqui, um grito de socorro é ouvido pela cidade toda.

Meu trabalho, como de qualquer outro profissional de saúde, é cansativo, mas recompensador. Tenho recebido mensagens de todo o Brasil, impressionados porque eu comecei a andar de jegue para me aproximar das pessoas. Não fiz nada de mais. O carro não pode chegar onde o jegue chega e essa é uma imagem representativa de como é um trabalho de amor.

Todos os dias, convivemos com os riscos, principalmente durante a pandemia. Não sabemos se as pessoas que chegam ou as que atendemos são assintomática. Minha mãe é enfermeira e trabalhou na cidade, atendendo também essas pessoas, durante 20 anos. Acho que foi um caminho natural e fico feliz, muito feliz, em poder ajudar. Às 17h, mais ou menos, termino o trabalho e vou para minha casa a pé. É uma distância de só cinco minutos. As coisas mudaram um pouco, ninguém me chama mais para um bolo, um lanchinho, um almoço, como faziam. Aqui, todos se conhecem e vivem próximos, tomando cafezinho no portão.

Depois do trabalho, já em casa, fico ansiosa como a maioria das pessoas ficam quando vêem o tanto de notícias. Moro sozinha e já passo meus dias envolvida no assunto. Mas, ter voltado para cá – depois de cursar Enfermagem em Feira de Santana – e poder atuar em um momento como esse, me mostra que a escolha foi certa. De jegue, de mula, de cavalo, seja lá como for, o que importa é que a saúde chegue para todos. Se for com carinho, melhor ainda".

Correio 24 Horas

Bahia


Governo quer auxílio rebatizado, com 3 parcelas de R$ 200 e exigência de curso

Governo quer auxílio rebatizado, com 3 parcelas de R$ 200 e exigência de curso

Jacobina - IFBA lança edital para seleção de estagiários

Jacobina - IFBA lança edital para seleção de estagiários

Dupla em moto comete três assaltos no bairro dos Índios, em Jacobina

Dupla em moto comete três assaltos no bairro dos Índios, em Jacobina

Vendedora que salvou motorista de caminhão aguarda cirurgia no SUS

Vendedora que salvou motorista de caminhão aguarda cirurgia no SUS

Petrobras anuncia venda de 28 campos de produção terrestres na Bahia

Petrobras anuncia venda de 28 campos de produção terrestres na Bahia

Jacobina - MP dá prazo para a Mercúrio resolver problemans de obras
inacabadas na Jacobina II e IV

Jacobina - MP dá prazo para a Mercúrio resolver problemans de obras inacabadas na Jacobina II e IV

PF prende célula do Estado Islâmico que planejava atentado na Olimpíada
do Rio

PF prende célula do Estado Islâmico que planejava atentado na Olimpíada do Rio

Bahia registra 8 óbitos e 705 novos casos de Covid-19

Bahia registra 8 óbitos e 705 novos casos de Covid-19

Servidores municipais lotam a Câmara de Vereadores de Jacobina

Servidores municipais lotam a Câmara de Vereadores de Jacobina

07 segredos que você não sabe sobre Cartão de Crédito Consignado

07 segredos que você não sabe sobre Cartão de Crédito Consignado