O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) retomou as sessões plenárias nesta quarta-feira (24) e já entrou para história por ser a primeira por videoconferência. A última sessão foi realizada no dia 11 de março, pouco antes da adoção das medidas para conter a pandemia do novo coronavírus. A sessão, além de ser marcada por dúvidas técnicas com o sistema do Lifesize, teve um grande debate sobre a remessa ou não de uma sindicância contra o juiz Ronald de Souza Tavares para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O magistrado, durante um plantão, suspendeu uma penhora de matrículas imobiliárias de quase R$ 95 milhões, sem qualquer pedido das partes. O motivo para o debate foi a declaração de impedimento ou suspeição de 19 desembargadores para participarem do julgamento. A questão era saber se o caso concreto que motivou a penhora estava relacionado às terras que são objeto da compra e venda de sentenças investigadas na Operação Faroeste. E, conforme dito pela desembargadora Telma Britto, uma das magistradas que pediram para se abster de votar, uma das partes pertence a um dos grupos que disputam as terras da fazenda de José Valter Dias. A questão está relacionada à Fazenda Rainha da Serra e Sagarana 1 e 2.
Segundo o relatório feito pelo desembargador José Alfredo, corregedor Geral de Justiça, havia uma decisão do desembargador Lidivaldo Reaiche, em um agravo de instrumento, para que o juízo de origem averbasse constrição judicial junto à matrícula do imóvel oferecido como complementação à garantia de uma execução, devidamente cumprida pelo juízo da 2ª Vara Cível de Barreiras, no oeste baiano. Ocorre que, no dia 20 de dezembro de 2017, o juiz Ronald de Souza Tavares, como plantonista do recesso judiciário de fim de ano, “sem nenhuma provocação das partes”, determinou a suspensão da penhora, de forma a figurar os imóveis apenas como caução judicial, sem publicização aos servidores do Cartório de Registro de Imóveis. Por força de uma resolução, o juiz não poderia suspender a penhora, por não ser um caso de urgência para ser analisado em um plantão.
Dos 51 desembargadores presentes na sessão desta quarta, apenas 32 puderam votar. Os aptos concordaram com o voto do relator de afastar o juiz sindicado e instaurar o processo administrativo disciplinar. A partir de uma questão de ordem feita pelo desembargador Júlio Travessa, 12 desembargadores pediram a remessa da sindicância para o CNJ por ter melhores condições de julgar o magistrado, por falta de quórum qualificado no TJ-BA, com um terço da composição suspeita de votar. Para abertura de um processo administrativo disciplinar contra juiz não é preciso de um quórum qualificado, tendo maioria simples. Entretanto, para afastar um juiz é preciso que se tenha maioria absoluta dos votos.
Entre os desembargadores que não puderam votar estavam Lourival Trindade; Eserval Rocha, por ter sido instado pelo CNJ por diversas vezes antes da Operação Faroeste a se manifestar sobre os magistrados investigados da região de Barreiras; Telma Britto, por ter sido uma das desembargadores que anulou a portaria envolvida na disputa das terras do oeste; e Lidivaldo Reiche, por ter sido o relator do agravo que determinava a penhora no caso concreto. Também se declararam suspeitos de votar desembargadores Ilona Reis, Lígia Ramos e Dinalva Laranjeira.
Os desembargadores que defendiam a remessa dos autos para o CNJ lembraram que o próprio TJ-BA, ao analisar a sindicância do desembargador Ruben Dário, constatou que não havia condições de julgar o feito na Bahia. Em maio de 2012, o CNJ aposentou o desembargador compulsoriamente por venda de sentenças. Mário Alberto Hirs, Travessa e o desembargador José Aras salientaram que há risco do julgamento ser anulado por falta de quórum qualificado. A legislação exige a presença de 2 terços de votos favoráveis para instaurar o procedimento, afastar e punir magistrados. Mesmo assim, prevaleceu o voto do corregedor pela abertura do processo administrativo com afastamento no próprio TJ-BA.
Por Cláudia Cardozo
Bahia